Dezenas de universidades ao redor do mundo têm disponibilizado seus cursos on-line e gratuitamente (Harvard, MIT, Berkeley, são algumas — veja na plataforma Edx tudo o que você pode encontrar).
A educação a distância e essas oportunidades de acesso a bases de universidades, como a de Harvard, fazem parte de uma revolução maravilhosa do conhecimento, algo que só irá crescer e transformar a vida de cada vez mais gente.
Por outro lado, esse movimento de fazer a própria educação está deixando um lastro sutil de conhecimentos rasos, tanto em geradores de conteúdo quanto nos leitores, espectadores etc. Depende de nós dar profundidade e suplementar as falhas do processo e não partir da premissa que ele seja perfeito, apesar de maravilhoso. Então, vamos refletir sobre algumas dessas falhas.
A disponibilidade do conhecimento mudou a forma de nos comportarmos em relação a ele. Hoje, quando queremos saber de algo, buscamos no Google a resposta e sabemos que vamos encontrar. Lá tem todo tipo de conteúdo, porém a maior parte das pessoas se contenta com as primeiras respostas, e não sabem ou não se preocupam muito em filtrar, selecionar.
Além disso, todas elas são respostas prontas. Veja que isso é exatamente o que acontece na educação tradicional que vem sendo tão criticada: respostas prontas vindas de um agente imbuído de maior autoridade que o aluno.
Talvez daí venha o nosso comportamento de aceitar essas respostas, nosso padrão de interação com o conhecimento continua sendo passivo nesse sentido. Mas a educação que precisamos para o mundo que está se revelando deve ir muito além disso, porque para esse novo mundo é necessário construir muitas respostas. É necessário construir um caminho próprio para alcançar seus sonhos.
Nesse contexto, como desenvolver senso crítico e um conhecimento mais aprofundado?
Como protagonistas de nossa educação somos nós que precisamos nos preocupar com isso. Se por um lado não há limite no conhecimento que está disponível, por outro nos impomos o limite de conteúdos como “10 dicas para…”.
Uma das coisas que mais ajuda a dar profundidade ao conhecimento é a discussão e interação com outras pessoas que estão envolvidas no mesmo processo. A riqueza dos pontos de vista e aplicações do conhecimento nos deslocam para uma posição mais reflexiva.
Mas não estamos falando de discussões em que cada um expressa seu ponto de vista, interage de forma preconceituosa com opiniões diferentes e onde raramente “você tem razão, não tinha pensado nisso…” aparece no contexto.
Para que esse nível de interação aconteça, é necessário um mínimo de empatia, confiança, e respeito. Essas coisas se constroem com o tempo e, em geral, são catalisadas pela presença física de um outro e de uma comunidade de aprendizado.
Outro desafio é a experiência. Conhecimento é comportamento, falar sobre um assunto demonstra um nível de conhecimento, realizar uma intervenção no mundo utilizando aqueles conceitos implica uma profundidade muito maior. Mas sentados na cadeira de frente para o computador, essa prática fica bastante limitada.
E não basta sair por aí “fazendo”, aprender fazendo é diferente de “tentativa e erro”. Aprender fazendo é refletir, pedir ajuda de quem tem mais experiência, fazer com orientação. Tentativa e erro pode ser reinventar a roda (o que pode ser muito rico, mas também desgastante para você e para o ambiente, é preciso ponderar). Isso nos leva a outra limitação do conhecimento absorvido a distância: o “como fazer” é mais dificilmente transmitido assim.
Outro elemento importante a ser considerado é o que chamamos de “aprendizagem por regras” versus “aprendizagem por contingências” que envolve se expor e vivenciar o ambiente. Quando recebemos instruções e lemos um manual, ou 10 dicas, estamos pegando um importante atalho que possibilita a evolução do conhecimento, da cultura e ganho de tempo para outros desafios de nosso dia a dia.
Mas a aprendizagem por regras nem sempre deixa claro todos os elementos do ambiente que geraram aquele conhecimento ou em quais situações ela faz sentido ou não. Por isso a aprendizagem por contingências é mais rica — vivenciamos o ambiente, as consequências geradas e aprendemos quais variáveis do ambiente influenciam (nosso “conhecimento tácito” é desenvolvido assim).
Observamos no ambiente empreendedor que, para a maturidade e para o desenvolvimento de muitas habilidades, não existem atalhos ou regras bem descritas. Ainda estamos falando da vida off-line construindo um repertório rico de habilidades para lidar com as pessoas, com o negócio, com as pressões da rotina.
Catalisar esse processo, significa viver com intensidade e consciência as experiências de intervenção no seu ambiente, significa fazer estágios, visitar o cliente, conversar com o maior número possível de pessoas, desenvolver empatia… tantas coisas, sempre observando o efeito ou resultado que seu comportamento tem no ambiente, avaliando o que funcionou ou não.
Outro elemento que tem sido negligenciado pelo encantamento da difusão do conhecimento, é o poder que o afeto possui em catalisar a aprendizagem. Certamente a maior parte das coisas que nos tornamos bons em realizar vêm de um processo de aprendizado cheio de troca e afeto com alguém que nos acompanhou nesse momento (mães, amigos, professores).
O prazer de aprender aumenta quando há um ambiente de afeto e esse prazer “fixa” a aprendizagem, enriquece seu significado — pense em empatia, contato físico, sorrisos no processo.
Essas são algumas reflexões importantes para que sejamos mais conscientes quanto a nossa educação, mais protagonistas. Aprendendo a usar tudo o que o mundo online pode oferecer — em todas as línguas, a qualquer momento, mas reconhecendo que a vida acontece off-line — e, por isso, parte determinante de nossa educação sobre todos os temas deva ter esse momento.